segunda-feira, 18 de abril de 2011

O Sótão - Parte 2

          Todos sabem que minha casa tinha um sótão muito especial, ao menos para mim. Era vasto, escuro, misterioso e de fácil acesso, o que me deixava dividido entre a curiosidade de desvendar e o receio de me meter em um lugar que, afinal de contas, nem era pra ser frequentado. Já entendia que existiam certas coisas sobre as quais era melhor nem ficar sabendo, naquela linha de que em alguns momentos da vida, a "ignorância" é mais confortável e saudável do que o conhecimento. Às vezes tinha vontade de continuar o trajeto, mas surgiam outras coisas, e o plano ia ficando pra depois.

          E um dos motivos que me fizeram adiar mais ainda a continuação da aventura foi por uma bobagem que eu fiz, não sei porque fiz aquilo, não tinha por quê.


          Eu sempre tive um misto de curiosidade e medo de filmes de vampiros e lobisomens. Quando eu era criança, lá pelos 6 anos, lembro de ver trechos de filme de vampiros, sempre a tarde, mas não olhava ate o final. E o mais célebre e aterrorizante "lobo-homem" da minha infância foi o Michael Jackson, no clipe de Thriller. Esses inputs da sétima arte povoaram minha imaginação durante muito tempo.

          Lembro também de uma reportagem no Fantástico sobre a suposta aparição de um caninus-humanus numa região do Brasil, lá pelo Nordeste, com depoimentos de testemunhas e tomadas de filmagem à noite, na residência rural onde ele teria aparecido. Imagina isso tudo "plantado" na minha mente fértil, propensa a cultivar as mais reais possibilidades de existência desses seres, e ainda por cima eu morando numa região meio rural. Eles poderiam vir aqui em casa, pelo matagal que havia atrás do meu pátio!!!!!

      Meu falecido pai, percebendo meu misto de preocupação e curiosidade, não tratou de desmanchá-lo, mas o encorajou, brincalhão que era. Certa vez me disse que assobiar a noite chamaria lobisomen. Deve ter se divertido muito, e me amado mais ainda, depois de ter visto meu olhinhos arregalados perguntando: “É mesmo????” Nunca mais assobiei de noite...

          Bueno, mas o que me fez adiar a volta ao sótão foi o seguinte: estávamos eu e meu pai em uma banca de revista, quando eu olhei um gibi que me chamou a atenção: era sobre histórias de vampiros. Lembro bem de abri-lo meio receoso, ler os primeiros quadrinhos e sentir dentro de mim o diabo da hesitação: compro ou não compro. A curiosidade venceu o medo, e adquiri o exemplar.

         Até ai, tudo bem. Li o tal gibi, eram histórias de vampiros como qualquer outra, todos sabem, a mocinha indefesa se vê em uma casa extremamente gigante, com um anfitrião pra lá de excêntrico, misterioso e metido a galanteador. Daí o cidadão, não tendo suas investidas bem recebidas pela gata, resolve ignorar e ataca na jugular da moça, que vira sua escrava eterna. Ele atacaria de qualquer forma, mas primeiro tenta na conversa. Não deu, vai à força.

     A bobagem que eu fiz, não sei o que me deu na cabeça, foi ter jogado o gibi lá no sótão. Um dia o peguei, fui até a entrada, e simplesmente arremessei lá dentro, no meio dos entulhos de madeira embaixo do telhado. Lembro da história, mas não lembro o motivo de ter feito isso. Medo, talvez. Queria me livrar do objeto, mas queria ter acesso fácil. Sei lá.

       Pois foi como se eu tivesse plantado uma semente de vampiro lá em cima. Que, aos poucos, germinaria em forma da criatura medonha, cresceria, se alimentaria primeiramente do sangue de algum ratinho ou passarinho, para depois iniciar cardápios mais complexos, tipo eu.   

       Esse era meu sentimento a cada vez que olhava para aquele telhado. Passei um bom tempo conferindo com olhar de “revesgueio” pro telhado. Se já tinha medo de subir lá novamente, com aquela situação, aí que não ia mesmo...

        O tempo passou, o sentimento se diluiu e acabei subindo lá de novo. A revista estava intacta, bastante empoeirada e nada de diferente aconteceu. Explorei o resto do sótão, me cuidando com algum bichinho indesejado e já vacinado contra qualquer “chamado” que viesse debaixo. Só encontrei pregos, pedaços de madeiras e algumas inofensivas teias de aranha.

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